(Se perdeste, na semana passada, a estreia de Crime Entre Amigos, podes ler aqui o capítulo primeiro.)
Capítulo II – 2 de Novembro
Rogério deixou-se
ficar atrás de um renque de arbustos despidos, o nevoeiro começava a entrar no
campo quando apareceu Edmundo, que se dirigiu para o abrigo nu e improvisado. A
conversa que o trouxe foi posta ali cruamente, os factos, por mais bizarros que parecessem, não os
iludiam, existiria algum fundo de verdade? Rogério pensou tratar-se de um
embuste, toda aquela história que o velho Gonçalves, tio-avô de Edmundo, contara em criança poderia ser uma fantasia ou, no
misto de verdade e mito, a tal imagem da santa da aldeia poderia ser mesmo única e valeria a pena consumar um crime? Edmundo insistiu durante minutos, decompôs o caso, taxativo, garantindo-lhe,
uma aparente veracidade do conto porque tinha provas – mostrou-lhe umas fotocópias de uma pesquisa que fez acerca de
um Conde Castelhano, que escondeu dentro da imagem da Santa, que mandara
fabricar, algumas preciosidades que saqueou durante uma incursão à Andaluzia.
Mais tarde a imagem foi trazida para Portugal num dote, já depois da morte do
cavaleiro cruzado, e acabou,
desconhecidamente, na igreja da sua aldeia, que pertencera a uma ordem
religiosa por testamento ou doação.
A história
abria vapores rubros num cérebro fervilhante de imaginação. Rogério, muito desconfiado,
concordou que havia uma possibilidade de tudo ser verdade, mas umas linhas escritas num papel não valem muito quando não
existem imagens, toda a pesquisa poderia ser uma fraude, e os esforços de Edmundo que pesquisara anafadamente seriam infrutíferos. Além disso, a ideia de realizar um assalto nem
lembrava a Rogério como partida de Carnaval, ou de careto; um acto precipitado, em última instância, devido à morte do
velho Gonçalves. Edmundo pretendia assumir a sua menina dos olhos verdes, e provar ao
seu tio que existiam dentro da imagem luzentes rubis e esmeraldas. O tio sempre
lhe respondeu que trouxesse provas, que não iria abrir a imagem a meio para
tirar o ougo, se bem que sentia com o tacto que a Santa era oca, mas crendo
sempre que no interior apenas existiria caruncho. Agora que morrera, o segredo
estalava com amargura na boca dos dois amigos. Pretextar o assalto ao santuário
era o mesmo que desenterrar o velho sacristão. Mas Edmundo estava decidido a limpar as águas e
enriquecer com o lendário tesouro. Rogério pensou no caso mas, na altura, não tinha uma resposta consistente, mesmo sabendo que no Porto, onde Edmundo vivia e trabalhava, encontraria maneira de vender as pedras medievais.
Seria rico, ou um homem abastado, e escolheria uma vida melhor que o fastio dos seus dias. Não tiveram mais tempo, a
conversa terminou e o ponto final ficaria para o outro dia.
1 comentário:
Fico à espera do capítulo III. :)
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